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Mentalidade de gênero e os antigos desafios da nova década




Apesar da matéria vir atraindo cada vez mais atenção desde o final do século, diversas mudanças na economia mundial impactaram intensamente as mulheres, as quais amargam empregos vulneráveis, a desregulamentação de mecanismos de proteção ao gênero, retirada de políticas de auxílio aos cuidados às crianças e idosos, sobrepesando a carga de responsabilidades das mulheres para além do trabalho remunerado, de acordo com o artigo da professora-doutora Mariana Jansen, Mulheres e a Economia - mulheres economistas: reflexões sobre avanços e limites do século XXI. Diante disso, os questionamentos e a avidez por transformações no sistema econômico estão mais e mais recorrentes, em busca de solucionar os insistentes desequilíbrios presentes.


Ainda há muito o que fazer para preservar e expandir as conquistas das mulheres em termos econômicos e sociais no Brasil e no mundo, sendo necessária a ampliação da sua atuação profissional e da participação no mercado de trabalho, a reestruturação da sua formação e educação enquanto mulher e profissional, de maneira mais autônoma e independente, estimulando o debate dos grandes temas pertinentes ao seu papel na sociedade, a fim de fortalecer, empoderar, gerar confiança e criar um ambiente favorável ao seu desenvolvimento de forma holística e, ao mesmo tempo, desvincular do antiquado e limitado pensamento que permeou o século XX, cujo perpetuava uma estrutura social pautada na desigualdade de gênero.


Sendo 45% das famílias brasileiras chefiadas economicamente por mulheres, segundo o IBGE, os últimos anos registraram recrudescimento do nível educacional do gênero, sendo 21,5% das mulheres entre 25 e 44 anos portadoras de diploma de ensino superior, muito acima dos 15,6% dos homens em 2016. No entanto, como amplamente divulgado, isto não lhes conferiu melhores rendimentos. Em todos os graus de escolaridade, não é novidade que os homens possuem remuneração mais elevada do que as mulheres. Além disso, quanto mais alto o nível educacional, maior a diferença de rendimentos: de 1,4 vezes para os que possuem até oito anos de estudo formal passando para 2,5 vezes quando homens e mulheres possuem mais de quinze anos de estudo regular, o que converge com os dados da PNAD do mesmo ano, que, considerando todas as ocupações (formais e informais), indicou que o salário médio das mulheres era 76% o dos homens.


Esta estatística reforça a atribuição dos afazeres domésticos e cuidados pessoais para o público feminino, o qual muitas vezes abandona sua carreira para se dedicar exclusivamente a tais tarefas, cujos salários são historicamente entendidos como receitas adicionais à renda do parceiro. Isto fica evidente na pesquisa supracitada que aponta que, entre a população ocupada, os homens alocam 10,5 horas em média por semana para este tipo de obrigações, enquanto as mulheres despendem 18,1 horas, ou seja, cumprem dupla jornada, limitando sua contribuição ao mundo externo.


E mais, na Revista Economistas do último trimestre, o artigo Gênero e outras desigualdades traz à tona que o fenômeno do acúmulo de trabalho remunerado e não remunerado pode ser considerado um impeditivo a uma maior participação feminina no mercado laboral, sendo apenas de 52,7% no quarto trimestre de 2018 frente a 71,5% da participação masculina (IBGE). Adicionalmente, uma grave implicância relatada por pesquisadores do assunto é que parte da inserção da mulher na população economicamente ativa está condicionada à submissão de uma outra ao trabalho doméstico.


No horizonte, espera-se uma revisão dos salários entre homens e mulheres em busca do equilíbrio; espera-se uma mudança na mentalidade de ambos no sentido de compartilhar as responsabilidades domésticas e familiares cada vez mais naturalmente; bem como também uma ação em prol do respeito à liberdade de escolhas das mulheres, as quais têm questionado o imperativo histórico e cultural da posição feminina ortodoxa, com destaque para a maternidade e para o domínio das habilidades inerentes à gestão do lar. Neste contexto, é possível afirmar que temos muitos desafios pela frente com vistas a alcançar a liberdade, independência e autonomia, sendo um dos caminhos a via econômica com educação e remunerações mais justas e equânimes, além de uma sociedade mais solidária e aberta para tornar mais rápida a transformação em curso.




Elinne Val é economista/UnB, mestranda em economia/Unifal-MG, pesquisadora e planejadora financeira.

 
 
 

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